AUXÍLIO DA TOMOGRAFIA COMPUTADORIZADA DE FEIXE CÔNICO NO PLANEJAMENTO DA CIRURGIA DE LEVANTAMENTO DO SEIO MAXILAR: RELATO DE CASO
RESUMO
A instalação de implantes em região posterior de maxila ainda é um desafio devido a grande reabsorção óssea após exodontia e pneumatização dos seios maxilares. Várias técnicas foram propostas para solucionar esta questão, entre elas o levantamento de seio maxilar. Complicações como perfuração da membrana de Schneider foram relatadas em 10-60% dos casos, o que pode ser reduzido com o preparo pré-operatorio correto e avaliação tomográfica da estrutura do seio maxilar para visualização, por exemplo, da presença de septos e posicionamento das paredes antrais e avaliação de alterações patológicas. Este trabalho tem como objetivo relatar um estudo de caso clínico de insucesso na cicatrização de um levantamento de seio maxilar.
Palavras-chave: levantamento de seio maxilar; tomografia cone beam.
ABSTRACT
The installation of implants in the posterior region of the maxilla is still a challenge due to great bone resorption after extraction and pneumatization of the maxillary sinuses. Attempts were made to resolve this issue, including maxillary sinus lift. Complications as the basis of the Schneider's membrane have been reported in 10-60% of the cases, which can be reduced with the correct preoperative and tomographic evaluation of the maxillary sinus structure for visualization, for example, the presence of septa and positioning of the anthratic walls and evaluation of pathological differences. This study aims to study the clinical case of failure in the healing of a maxillary sinus lift.
Key-words: maxillary sinus lift ; cone-beam computed tomography.
1 INTRODUÇÃO
A reabilitação com implantes osteointegráveis é um avanço visível na odontologia, porém o sucesso do tratamento depende em grande parte da quantidade e qualidade óssea do leito receptor. A instalação de implantes em região posterior de maxila ainda é um desafio devido a grande reabsorção óssea após exodontia e pneumatização dos seios maxilares. Várias técnicas foram propostas para solucionar esta questão como o levantamento de seio maxilar combinado com colocação de enxerto ósseo (AGHALOO et al, 2016), utilização de implantes curtos (THOMA et al, 2015), implantes inclinados e implantes zigomáticos na região anterior de maxila para compensar a perda de altura óssea (ESPOSITO et al., 2010).
A técnica mais comumente utilizada é a abertura de uma janela na parede lateral do seio maxilar com o objetivo de elevar a membrana sinusal, técnica descrita por Tatum em 1986 (TATUM OH, 1986) e modificado por Boyne e James, que introduziram o uso de osso autógeno da crista ilíaca (BOYNE PJ, JAMES RA., 1980) e por Wood e Moore (WOOD RM, MOORE DL., 1988), que utilizaram osso autógeno da região intraoral . Os estudos variam em suas técnicas de acordo com o tipo de biomaterial a ser inserido no seio maxilar para estimular a neoformação óssea como osso autógeno da crista ilíaca, calvária ou mento, substitutos ósseos sintéticos e até os estudos mais recentes que sugerem a possibilidade de neoformação óssea a partir do próprio coágulo sanguineo que é formado no espaço criado pelo descolamento da membrana sinusal sem a necessidade de inserção de material osteindutor (LUNDGREN S et al, 2000)
Complicações como perfuração da membrana de Schneider foram relatadas em 10-60% dos casos (NOLAN PJ et al, 2014) o que pode ser reduzido com o preparo pré-operatório correto e avaliação tomográfica da estrutura do seio maxilar para visualização, por exemplo, da presença de septos e posicionamento das paredes antrais e avaliação de alterações patológicas.
A tomografia computadorizada de feixe cônico (TCFC) é indicada previamente à elevação do seio maxilar, segundo DOBELE et al. (2013), e nela podem ser observados aspectos como espessura da parede lateral do seio maxilar, presença do trajeto da artéria antral alveolar e seu diâmetro, angulação do assoalho do seio, relação da membrana de Schneider com as raízes dos dentes adjacentes, septos sinusais e qualidade do osso subantral. Em 2002, KASABAH et al., compararam a visualização da presença de septos em radiografias panorâmicas e imagens de tomografia. As radiografias panorâmicas demonstraram diagnóstico incorreto em 44,1% dos seios (26,5% de falso-positivos e 17,6% de falso-negativos).
Este trabalho tem como objetivo relatar um caso clínico de insucesso na cicatrização de um levantamento de seio maxilar, o acompanhamento e finalização do processo reabilitador.
2 RELATO DE CASO
Paciente do sexo feminino, leucoderma, 55 anos, apresentou-se relatando dor e aumento de volume da face do lado direito após realização de enxertos nos seios maxilares com objetivo de instalação de implantes na maxila.
Num primeiro momento, o dentista solicitou a radiografia panorâmica para avaliação dos seios maxilares e rebordo alveolar remanescente para o planejamento da reabilitação protética (figura 1). Em seguida, após o procedimento cirúrgico de instalação dos enxertos, a paciente persistiu com sintomatologia dolorosa e aumento de volume na face do lado direito, foi solicitado novamente uma radiografia panorâmica (figura 2), na qual foi possível visualizar uma área radiolúcida difusa em permeio ao material de enxerto ósseo no seio maxilar direito, associando-se os dados clínicos com os achados imaginológicos. Foi sugerido o diagnóstico de sinusite e a necessidade da complementação com imagens de TCFC para melhor avaliação.
Por meio das imagens de TCFC, foi possível observar uma imagem hiperdensa de aspecto granular apresentando imagem hipodensa difusa em permeio localizada no seio maxilar direito, o que sugere falha na compactação e consequente instalação do enxerto ósseo no seio maxilar. Nota-se também, imagem sugestiva de enxerto ósseo dispersa no seio maxilar, sugerindo o rompimento da membrana sinusal no momento do procedimento cirúrgico. Grânulos do enxerto ósseo foram observados próximo ao soalho da órbita e do óstio sinusal. Além disso, verifica-se preenchimento total do seio maxilar direito com densidade de tecido mole, sugerindo a presença de retenção de líquido ou muco provenientes do processo inflamatório em curso (figuras 3, 4 e 5).
Após a curetagem da região e aguardado o tempo de cicatrização e remissão do quadro doloroso, foi realizado um procedimento de instalação de enxerto e uma nova radiografia panorâmica foi solicitada para visualização do pós operatório (figura 6). Constatado o sucesso do procedimento, os implantes dentários foram devidamente instalados e uma nova radiografia panorâmica de controle foi solicitada (figura 7).

Figura 1. Radiografia panorâmica inicial, prévia a cirurgia de levantamento de seio maxilar.

Figura 2. Radiografia panorâmica, 3 meses após a cirurgia de levantamento de seio maxilar

Figura 3. Reconstrução coronal de TCFC. Pós-operatório mostrando material de enxerto disperso em seio maxilar direito (seta amarela).

Figura 4. Reconstrução axial de TCFC. Pós-operatório mostrando material de enxerto disperso em seio maxilar direito (seta amarela).

Figura 5. Reconstrução Sagital de TCFC. Pós-operatório mostrando material de enxerto disperso em seio maxilar direito (seta amarela).

Figura 6. Radiografia panorâmica logo após a reinstalação do enxerto ósseo.

Figura 7. Radiografia panorâmica final, após a instalação dos implantes.
Em seguida, foi realizado o escaneamento intraoral (Trios 3 COLOR, 3SHAPE Holmens Kanal 7,4.1060 Copenhague K Dinamarca) e este escaneamento foi combinado com a TCFC em um software de planejamento cirúrgico ImplantViewer (AnneSolutions, São Paulo, Brasil) para confecção do guia. Foram utilizadas estruturas dos tecidos moles e duros do paciente com o objetivo de combinar a TCFC e o escaneamento intraoral. Uma cópia virtual de broca foi incorporada no software ImplantViewer sobreposta a região do dente 21 (figura 2). Usando as posições descritas do drill virtual, o software gerou um modelo virtual usando a sua ferramenta de designer. Outra manga com as mesmas características das anteriores foi praticamente incorporada ao guia cirúrgico para direcionar o acesso da broca pela raiz. As imagens do guia endodôntico projetado (figura 3) foi exportada em um formato STL (estereolitografia) específico e enviadas para um Impressora 3D.

Figura 2. Imagens de TCFC no software de planejamento cirúrgico em que em possível visualizar na cor rosa o trajeto do guia nas reconstruções transversais (A,B e C) e nas reconstruções axiais (D E, F e G).

Figura 3. Em (A) a imagem do modelo virtual com o espaço para o acesso ao canal. (B) o planejamento virtual do guia na imagem de TCFC e em (C) o planejamento virtual da adaptação do guia no modelo
3 DISCUSSÃO
A cirurgia de levantamento de seio maxilar é o procedimento mais comum na implantodontia devido ao grande número de casos com perda óssea extensa na região posterior de maxila com consequente pneumatização dos seios maxilares. Implantes instalados em regiões que receberam a técnica tiveram uma taxa de sobrevivência de 98,6% - 93,5% após 3-5 anos de carga segundo PJETURSSON et al (2008) e MORDENFIELD et al (2015).
O planejamento do tratamento pode reduzir o risco de perfuração da membrana sinusal, pois fatores anatômicos como presença, localização e direção do septo maxilar, a espessura e os ângulos das paredes do seio maxilar e a espessura da membrana de Schneider precisam ser avaliadas com critério e examinados nos exame radiográficos e tomográficos. No entanto, mesmo com cuidadoso planejamento, a perfuração da membrana sinusal não pode ser garantida.
A prevalência de seios maxilares com septos relatada na literatura é de 16% a 48% (ROSANO et al, 2010 ; PARK et al, 2011), com maior ocorrência em indivíduos desdentados em comparação com indivíduos dentados (QIAN et al, 2016). O estudo confirma que cuidadosa avaliação pré-operatória em exames tridimensionais como a TCFC é importante na prevenção da perfuração da membrana durante o procedimento de elevação do seio.
Dentre outras intercorrências além da perfuração da membrana de Schneider, que pode ter ou não sintomatologia associada, estão a infecção pós operatória, edema e hematomas decorrentes do ato cirúrgico. No estudo mostrado por IRINAKIS et al (2017), num total de 79 casos de levantamento de seio maxilar, complicações pós-operatórias ocorreram em apenas oito seios, resultando em uma taxa de 10%. A maioria das complicações ocorridas foram infecção pós-operatória do enxerto (5%) e outras complicações(1,3%). Nenhuma das complicações resultou no fracasso do aumento do seio. O estudo também relata que os pacientes fumantes apresentaram maior ocorrência de perfurações de membrana e os não fumantes tiveram maior taxa de complicações pós-operatórias. A presença de um histórico médico significativo (diabetes mellitus tipo I e tipo II, osteoporose em medicação com bisfosfonatos e sinusite) não foi associada com a ocorrência de perfuração da membrana ou complicações pós-operatórias.
Em outro estudo, SCHWARZ et al (2015) identificaram presença de septos sinusais e altura residual da crista menor que 3,5 mm como principais fatores de risco para perfuração da membrana na cirurgia de elevação do seio.
Neste estudo podemos perceber que a TCFC é de fundamental importância para o correto planejamento das cirurgias de aumento do seio maxilar, porém este exame não garante a não perfuração da membrana de Schneider e consequente fracasso do enxerto, embora minimize a possibilidade de intercorrências.
4 CONCLUSÃO
Por ser um procedimento delicado, a cirurgia de levantamento de seio deve ser corretamente planejada com o auxilio de exames por imagem para minimizar a possibilidade perfuração da membrana de Schneider, sendo a TCFC atualmente o exame mais completo para esta avaliação. Ainda assim, o planejamento pré-operatório adequado não impede intercorrências no transoperatório. Além disso, a TCFC pode ser considerada um excelente exame para avaliações pós-operatórias das cirurgias de aumento do seio maxilar, sendo capaz de identificar possíveis perfurações, falta de compactação do material de enxerto e extravasamento deste para estruturas nobres.
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